quarta-feira, 6 de abril de 2011

MASSAROKANDO escrito por Jutilde

A massaroka continua nos sonhos, muita coisa uma por cima da outra, sem identificar direito as coisas, só lembro de água, gato, plantas, Mariana eu lembro, parece que assim claramente de humano só ela, acho que foi porque quando assistíamos a TV no palco, ontem, pedi para descansar os braços no travesseiro dela, mas como me fez bem estar nessa massaroka, até queria mais, e lembrei de uma massaroka grande que participei, foi com Denilton Gomes,nos anos 80, no último ano da Comissão de Dança, primeira tentativa de organizarmos o estudo de dança em Sampa, via ajuda governamental, mas Denilton já estava meio doente, faltava muito as aulas e todos ficávamos putos, ninguém sabia que ele estava doente, e quando chegou o fim do ano ele tinha que mostrar o resultado do curso, organizou tudo correndo e pintou essa massaroka e foi lindo, ele fez um caminho de sapatos até a montanha humana e como eu era a mais subnutrida do grupo, magra, só tinha osso, ele me fez subir a massaroka e ficar lá em cima com cara não sei do que, acho de quem olhava pro infinito, acho que estava olhando essa outra massaroka que aconteceu agora.

Vou arriscar uma poesia, eu nunca me senti muito familiar com poesia, mas ultimamente ela tem brotado deve ser meu amor pelo japa Gackt.

Massaroka

Massa humana

Pegajosa e grudenta

Macia e deslizante

Flutuante e perfumada

A corpos queridos e suaves

Que tem nomes, palavras indecifráveis

Absurdos decifráveis e atraentes

Minha saudade não tem tamanho

De novamente me massarokar e

Acabar em berço esplêndido

Como foi ontem terminar no colinho da Diana

A índia potiguar abandonada no chão duro

Tão esquecida que nem aparece na lista das tribos citada no Wikipedia.

Essa foi a intensidade dos meus sonhos essa noite. E engraçado me lembrei do Denilton.


Jutilde

Texto de Marilio Gonzalez (participantes do Atelie coreografico)

Queridos amigos desta breve e belíssima experiência, primeiramente gostaria de contar-lhes um pouquinho de minha história mais ou menos recente, para que conheçam uma parte de minha vida, que começou a ser cigana aos 24 anos. Quase no final de 2005, devido a uma depressão profunda, precisei interromper, exatamente na metade, meu curso de pedagogia da dança na UERGS- Universidade Estadual do Rio grande do Sul-. Dado ao estado em que me encontrava, a única saída, o único refúgio, a única possibilidade era o mar, em francês "la mer" que soa como mère e, assim sendo, caí não nos braços, mas nas águas da mãe Iemanjá. Ela acolheu-me durante 1 ano e meio, entre novembro de 2005 e maio de 2007, onde desliguei-me por completo do tema dança e dei boas rizadas quando dela senti-me livre.

Fazia terapia, era assistido e medicado por psiquiatras, estava leve e desfrutando desse novo sentir. Trabalhei na cozinha de um restaurante e comecei a dar aulas de inglês. O que mantive nesse período foi o hábito de correr, caminhar, e exercícios que realizava nas barras localizadas na praia, à disposição de quem quiser utilizá-las. Minha vida voltou-se para um raciocínio pragmático e foram “definitivamente” banidas as “divagações” artísticas. Estava em jogo toda a minha saúde psicossomática e não queria sucumbir a isso. Em uma das sessões de terapia, a psicóloga, em 2006, perguntou-me se alguma vez havia pensado em tentar São Paulo, ao que respondi-lhe... que, na verdade não. E aquilo deslizou para algum lugar de mim tornando-se invisível.

Evitando, então, uma narrativa prolongada e recheada de acontecimentos e razões, acelerando o curso dos acontecimentos, ludibriando o tempo, que na verdade inexiste, em maio de 2007 tomei coragem, e cheguei à Estação Tietê desde Santa Catarina, com toda a bagagem. Essa chegada foi cinematográfica, não conhecia nada, transportei caixas e demais coisas via metrô depois das 21h, evitando o rush, desci a Teodoro Sampaio a pé com tudo aquilo, e dormi a primeira noite no quarto da pensão, em Pinheiros, a qual foi aqui, durante três meses, minha primeira casa.

Considerando o narrado anteriormente, verão que minha vinda a são Paulo tinha um intuito totalmente prático e utilitário, meu foco eram escolas, consultorias de línguas, empresas, muito estudo e sucessivas provas para ser admitido como professor. A primeira a dar sinal positivo, uma unidade Fisk, foi pega com unhas e dentes.

Mas, nesse meio tempo, sem querer, fui meio que seduzido, e uma certa fraqueza levou-me a um lugar onde gente conhecida do meio, precisava de um “mover”. Com essas pessoas permaneci apenas três dias, o tempo necessário para perceber que estava entrando novamente em terreno “perigoso” e, desapareci deles para mergulhar definitivamente nas salas de aula da Fisk, de onde obteria os recurso$ para sobreviver aqui . Mas a teimosia era tão grande, que, inventei , para o grupo de crianças que cursavam espanhol comigo, o aprendizado dos números via coreografia: movimento, contagem em castelhano, acompanhados de música eletrônica. Uma verdadeira escusa.

Sobre o final de 2007 resolvi fazer aulas de afro e, no ano seguinte, deu-se, novamente, o encontro com esse primeiro pessoal dançante que conheci, e com os quais cheguei a fazer algo mas, presenciei tantos solos de soberba intelectual , momentos de invasão e até desrespeito que, bruscamente, retirei-me.

Na metade de 2008 fui atrás de uma nova experiência que durou até janeiro do ano seguinte. O encerramento foi uma nova decepção e aí disse-me: “Pra rua meu! Vai pra rua e esquece o resto!” Então Adorei a ideia que tive, e o ”Lumpen “, foi a personagem que no verão de 2009 brindou-me com o desafio, o medo, o prazer e a coragem de mergulhar, durante 1h e meia, nas ruas do centro da Pauliceia, in solo, depois da meia-noite. Foram cinco experimentos muito bem sucedidos e a missão cumprida.

Durante esse ano, no lugar perto de casa, nos Campos Elíseos, onde então fazia musculação à noite depois do trabalho, na diminuta sala onde treinavam body-jump, encontrava uma forma de alongar e arriscar algumas frases de movimento. Foi em maio de 2010 que, ao mudar de academia, encontrei a brecha para trabalhar de forma mais distendida: um espaçoso salão destinado ao trabalho aeróbico estava ali, à minha espera e, aos poucos, exercitando, testando, fui começando a fixar sequências de movimento que cresceram à medida que dei-lhes, mantendo essa disciplina de trabalho solitário, uma atenção diária. Foram pedindo a elaboração de uma peça de dança que ainda não possuía tema para o qual exigi-me paciência, procurando lidar com, e percebendo os momentos de ansiedade.” Afinal não sei onde, nem quando, nem para quem, nem como vou apresentar isso, de forma que qual é o sentido da pressa? Deixa rolar e vai amadurecendo!”

Daí, em uma aula de espanhol, na sala de uma empresa, apareceu o poema de Borges “La larga Búsqueda”. Gostei ! Denso, enigmático, hermético, remete ao Aleph. Comecei a testá-lo em movimento, fazendo uso da voz, dando aos versos uma tonalidade burlesca que não desfaz a densidade do poema, criando uma tensão e dramaticidade constantes. Mas, Faltava a música e passei meses tentando encontrá-la. Em uma das correspondências que mantenho com meu amigo Gustavo Gadea diretor do Grupo Mu-Danza, de Montevideo, sugeriu-me que procurasse composições de Iannis Xenakis e “Orient-Occidant”-com alternâncias de silêncio-, caiu como uma luva para a obra, assim como “Solitude” cantada por Billie Holliday.

Pude mostrar “Anterior al tempo o fuera del tempo o en um lugar que no es del espácio: versos de uma larga busca” a Gustavo e Bárbara, no seu estúdio, em fevereiro passado, quando estive com eles em Montevideo. Queria que esses dois amigos, egressos do “Taller de danza del Teatro San Martín” de Buenos Aires, dessem seu aval.

Retornando de minha viagem, reiniciei meus ensaios no mesmo espaço, sempre com novos achados para esse conto sobre mim mesmo, no transitar dentro da dantesca São Paulo, como um elemento a mais dessa viagem que escolhi viver, e que me levou a juntar-me a vocês nessa experiência divina, onde todos fomos unos na diversidade e que ficará em meu corpo enquanto estiver por aqui e nas outras dimensões pelas quais ele se expandir. Fomos generosos, fomos alegres, fomos comprometidos, fomos presentes, fomos amigos e cúmplices durante essa felicíssima experiência. Acessamos recintos inesperados e fizemos com que cada um visitasse, de alguma forma mais ou menos intensa, o do outro, para, em cada nova oportunidade, e à medida que o processo se desenvolvia pudéssemos carrega-lo com esse poder de criar que, sem conhecer-nos, fomos capazes de atingir em tão pouco tempo. Para mim é um presente que recebi de, e dou a todos... ainda estou contaminado por essa coisa, e destaco-a como uma das vivências deveras felizes de minha vida. Sampa, para quem vem de outros lugares, oferece hostilidades que, quem aqui nasceu não sente, porque desenvolveu anticorpos, porém, nós migrantes somos permeabilíssimos, mesmo aprendendo seus códigos. Por isso acho que essa surpresa é maior em mim. Encontramos uma manifestação de solidariedade, troca e simpatia, de modo que será difícil esquecer os momentos passados com a excêntrica e hilariante índia Jutilde, o filho Rafa, a filha Thaís, as manas Mariana e Larissa, A Dançaluzarquiteta, a Bamboleante Bárbara, la Milonguera Lupe, Carol Enlaçada, Suellen Ballroom, Diana Olhos que Enganam e... Mikaela, vem Comigo. Sem descuidar o cuidado, o carinho, o respeito e a generosidade de nossos guias orientadores- companheiros: Gabriel, Cláudia, Junior, Janaína e o fotógrafo Marcelo que presenteou-nos com as belas, simples, valiosas imagens que registrou. Não sabendo mais o que dizer...Muito, mas muito obrigado a todos por toda essa chance que nos demos de ser juntos !!!

Marilio Gonzalez

4 de abril de 2011, 3:23


PS.: O fundamental é ter conseguido distanciar-me do isolamento ao qual estou habituado. Alcançar uma proximidade com novos corpos, seus matizes e repertórios, respeitando zonas, regiões, que para alguns encontram-se em processo de maturação.

Fazendo uso do intento, rompendo essa barreira forte e invisível que me resguarda. No lugar onde costumo ensaiar o faço com pouca iluminação, para permancer dentro desse abrigo que me permite ingressar em um estado extracotidiano.

Um rito à sós ( Don Juan de Matus, o mestre bruxo de Carlos Castañeda, chama-o "Caminho do Guerreiro"). Uma viagem solitária. É, também desse singrar, deslocar-se, em certos períodos, da comodidade do refúgio e sintonizar-se, saber como fazê-lo. Aprender a utilizar alguma coisa que encontra-se guardada em algum dos milhões de cofres do "cérebro-corpo", do "Body-Mind-Centering."

Estou acessando, com amigos "desconhecidos", em uma passagem de cinco dias, e exercitando, a ruptura de obstáculos que encerram-me em um elevado grau de misantropia.

Nesta experiência, neste intento de interação, penso que devo ter ativado algo que, racionalmente, me transporta ao sensível, exercitando o não julgar e vigiando as armadilhas que possam angustiar-me por interferências desse fator que nos impede: O ego que dentro carregamos.

( Escrito no segundo ou terceiro dia de ateliê )

Texto de Jutilde (participante de Atêlie coreografico)

Atêlie Cia Danças

O primeiro dia estava numa expectativa grande de enfrentar a técnica, é tanto que foi o dia que fiquei mais cansada, cheguei na escola de yoga muito esgotada, foi impressionante porque quase não mechemos o corpo, foi só mente, texto, pensamento. Acho que o corpo na espera de se mover e não aconteceu ficou tenso. Ainda bem que tinha 2 aulas de yoga para fazer, mas a cabeça não parava de pensar e tudo que conversamos no ateliê estava latejante, vivo , ansioso por todo o corpo. Aí resolvi não fazer a primeira aula e sentar e escrever o que estava sentindo e fiz a segunda aula, no relaxamento praticamente dormi que babei...hahaha.

Foi o único dia da oficina que anotei alguma coisa, é o que está no blog.
No segundo dia, já foi puro prazer, sai de lá com a alma lavada, leve, o corpo descansado, satisfeito , e como falei no blog cada dia foi um verdadeiro despertar de memórias incrível, além da arara que deve ser uma exibicionista porque ela já apareceu em vários momentos, toda vez que tenho que me apresentar e envolve mato, cheiro, bicho, ela aparece, passei muito tempo parando para cumprimentar essa arara, com meu filho amarrado na tartaruga.
Como meu propósito era despertar essa índia dentro de mim, a suavidade, o tempo e a doçura e na semana anterior tinha trabalho com a Edith e tinha despontado o círculo, trabalhei muito o círculo. Isso foi bem uterino, porque comecei a mexer no cabelo das meninas e todas vieram me falar que parecia uma coisa muito maternal, que tinha sido muito bom.
No terceiro dia tinha ido comprar os adereços que faltavam, a pintura, a pena, e o personagem ficou pronto, só que ele enlouqueceu, é o retorno. Aí vieram a tona muitas memórias, a extinção da tribo dos potiguares, que foi uma das primeiras tribos a sofrer um massacre total por não aceitação dessa colonização bárbara que tivemos, Câmara Cascudo tem várias lendas sobre os potiguares, de como eles se matavam para não compactuar com essa colonização, e uma segunda memória de um estudo que fiz sobre o trabalho de René Guenon de resgate das tradições, onde ele diz que um povo que tem uma tradição muito forte e perde-a de uma forma muito brusca, como a loucura e a morte chega de uma forma inevitável. Lembrei de uns anos atrás quando ouve vários episódios pelo Brasil de índios de matança em massa.
Uma outra lembrança foi o enterro do meu pai em 1993, em Estremós (RN) uma da primeiras vilas fundada ao redor de Natal, onde tem a lagoa de Estremós e a praia de Jenipabú, onde a brisa do fim da tarde é maravilhosa, o verde das árvores é muito intenso, e os macaquinhos andam livremente pelas quintais. Meu pai morreu nos meus braços, ele colocou a língua muito grande para fora, no último suspiro, e eu fiquei muito assustada e sai perguntando para todas as velhinhas da aldeia porque? Até que encontrei uma que me disse que era pedindo perdão e eu fiquei satisfeita, todos os homens da vila vieram ajudar a carregar o caixão, os animais todos vieram para a beira da rua de terra acompanhar o cortejo, meu pai adorava os animais, isso foi muito lindo e eu, na época numa fase muito indiana na frente do caixão com um incenso aceso, a igrejinha despontando na frente, parecia uma cena de filme do Glauber Rocha.
Ontem a índia se desconstruiu, perdi a pena, meus adereços foram parar na mão de outras pessoas e hoje vamos encerrar, vamos ver o que vai acontecer.
Foram importantes para mim todos os processos, desde o aquecimento no chão ,algumas palavras, como os ossos descansarem em cima do travesseiro de carne, isso foi perfeito, a única coisa estranha foi depois em pé permanecer com os olhos fechados e acelerar o ritmo, fiquei com medo de me machucar e fiquei com os olhos entre abertos, pq em agosto levei um tombo e desloquei o cotovelo direito, fiquei um mês com o braço engessado.
A parte do texto, poder ter fala foi também importante, mas a índia não conseguiu falar muito, teve momentos que só a boca mexia e me senti um clow.

Beijos

Ju

ATÊLIE COREOGRAFICO - CIA. DANÇAS 2011

Durante a temporadada da Cia. Danças na Galeria Olido com o espetáculo "PARES" ocorreu o Atêlie Coreografico do dia 30 de março à 03 de abril. 
Nesta edição do Atêlie, os participantes puderam criar dentro deste espaço de experimentação três possibilidades de pesquisa: o movimento a partir da limitação dos sentidos, o movimento a partir da célula de movimento e o movimento que se nutri do texto/fala. 

Apartir das criações e experiências do próprio grupo, inicio-se o propósito dos "apontamentos" (direção), onde os interpretes da Companhia de Claudia de Souza, direcionaram as experimentações para uma construção cênica/dramatica que dialogava com todos estimulos pessoais e vivências dos grupos dentro das três propostas apresentadas.

Muito material. Muitas sensações e experiências. Muitas histórias. Um processo que se iniciou para cada um e que não se encerrou, mas sim, pudemos consolidar pensamentos e projetos que se aplicarão daqui para frente em nossas vidas e projetos.

quinta-feira, 3 de março de 2011

“Quem somos nós senão uma combinatória de experiências e informações, de leitura e imaginações? Cada vida é uma enciclopédia, uma biblioteca, um inventário de objetos, uma amostragem de estilos, onde tudo pode ser continuamente remexido e reordenado de todas as maneiras possíveis.” (Italo Calvino)






segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011