quarta-feira, 6 de abril de 2011

Texto de Jutilde (participante de Atêlie coreografico)

Atêlie Cia Danças

O primeiro dia estava numa expectativa grande de enfrentar a técnica, é tanto que foi o dia que fiquei mais cansada, cheguei na escola de yoga muito esgotada, foi impressionante porque quase não mechemos o corpo, foi só mente, texto, pensamento. Acho que o corpo na espera de se mover e não aconteceu ficou tenso. Ainda bem que tinha 2 aulas de yoga para fazer, mas a cabeça não parava de pensar e tudo que conversamos no ateliê estava latejante, vivo , ansioso por todo o corpo. Aí resolvi não fazer a primeira aula e sentar e escrever o que estava sentindo e fiz a segunda aula, no relaxamento praticamente dormi que babei...hahaha.

Foi o único dia da oficina que anotei alguma coisa, é o que está no blog.
No segundo dia, já foi puro prazer, sai de lá com a alma lavada, leve, o corpo descansado, satisfeito , e como falei no blog cada dia foi um verdadeiro despertar de memórias incrível, além da arara que deve ser uma exibicionista porque ela já apareceu em vários momentos, toda vez que tenho que me apresentar e envolve mato, cheiro, bicho, ela aparece, passei muito tempo parando para cumprimentar essa arara, com meu filho amarrado na tartaruga.
Como meu propósito era despertar essa índia dentro de mim, a suavidade, o tempo e a doçura e na semana anterior tinha trabalho com a Edith e tinha despontado o círculo, trabalhei muito o círculo. Isso foi bem uterino, porque comecei a mexer no cabelo das meninas e todas vieram me falar que parecia uma coisa muito maternal, que tinha sido muito bom.
No terceiro dia tinha ido comprar os adereços que faltavam, a pintura, a pena, e o personagem ficou pronto, só que ele enlouqueceu, é o retorno. Aí vieram a tona muitas memórias, a extinção da tribo dos potiguares, que foi uma das primeiras tribos a sofrer um massacre total por não aceitação dessa colonização bárbara que tivemos, Câmara Cascudo tem várias lendas sobre os potiguares, de como eles se matavam para não compactuar com essa colonização, e uma segunda memória de um estudo que fiz sobre o trabalho de René Guenon de resgate das tradições, onde ele diz que um povo que tem uma tradição muito forte e perde-a de uma forma muito brusca, como a loucura e a morte chega de uma forma inevitável. Lembrei de uns anos atrás quando ouve vários episódios pelo Brasil de índios de matança em massa.
Uma outra lembrança foi o enterro do meu pai em 1993, em Estremós (RN) uma da primeiras vilas fundada ao redor de Natal, onde tem a lagoa de Estremós e a praia de Jenipabú, onde a brisa do fim da tarde é maravilhosa, o verde das árvores é muito intenso, e os macaquinhos andam livremente pelas quintais. Meu pai morreu nos meus braços, ele colocou a língua muito grande para fora, no último suspiro, e eu fiquei muito assustada e sai perguntando para todas as velhinhas da aldeia porque? Até que encontrei uma que me disse que era pedindo perdão e eu fiquei satisfeita, todos os homens da vila vieram ajudar a carregar o caixão, os animais todos vieram para a beira da rua de terra acompanhar o cortejo, meu pai adorava os animais, isso foi muito lindo e eu, na época numa fase muito indiana na frente do caixão com um incenso aceso, a igrejinha despontando na frente, parecia uma cena de filme do Glauber Rocha.
Ontem a índia se desconstruiu, perdi a pena, meus adereços foram parar na mão de outras pessoas e hoje vamos encerrar, vamos ver o que vai acontecer.
Foram importantes para mim todos os processos, desde o aquecimento no chão ,algumas palavras, como os ossos descansarem em cima do travesseiro de carne, isso foi perfeito, a única coisa estranha foi depois em pé permanecer com os olhos fechados e acelerar o ritmo, fiquei com medo de me machucar e fiquei com os olhos entre abertos, pq em agosto levei um tombo e desloquei o cotovelo direito, fiquei um mês com o braço engessado.
A parte do texto, poder ter fala foi também importante, mas a índia não conseguiu falar muito, teve momentos que só a boca mexia e me senti um clow.

Beijos

Ju

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